Seu navegador nao suporta javascript, mas isso nao afetara sua navegacao nesta pagina MPDFT - O concurso público e a camisa-de-força

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Maria Rosynete de Oliveira Lima
Promotora de Justiça do MPDFT

Em um país com poucas oportunidades de emprego como no Brasil, onde quase a metade dos desempregados é jovem, segundo pesquisa recente do Ipea, a possibilidade de ingressar no serviço público tornou-se o hit do momento entre os desempregados e subempregados. Assunto de primeira página dos principais jornais do país, ele trouxe consigo novos bens de consumo: apostilas, livros, cursinhos etc. Investimento é o que se ouve dos chamados “concurseiros”. Se, por um lado, tem-se o fornecedor privado desses bens, tem-se também, na outra ponta, o Estado, "fornecedor" do cargo, objeto de desejo de muitos, às vezes, milhares por vaga.

A vaga oferecida em edital para preenchimento não é, contudo, eterna. Ela tem uma vida útil inexorável, implacável e está atrelada ao prazo de validade do certame. E, assim como a Lei 8.078/1990 (Código do Consumidor) passou a exigir que o consumidor seja informado sobre o prazo de validade dos produtos e serviços, o edital do concurso público também deve dispor sobre o prazo de validade da seleção pública, tendo como norte o que já dispõe a Constituição Federal, no artigo 37, inciso III: até 2 anos, prorrogável uma vez, por igual período.

Assim, se, na relação de consumo, o prazo de validade indica o período em que o consumidor pode utilizar o bem ou serviço com segurança, em matéria de concurso público, a fixação do prazo de validade da seleção pública constitui também um elemento primordial para a disputa, porque é no seu intervalo que se devem dar todos os atos necessários para que a seleção cumpra a sua finalidade – preenchimento do cargo público vago pelo candidato melhor selecionado.

Tanto é assim que os candidatos aprovados no número de vagas ofertado podem exigir suas nomeações dentro do prazo de validade do certame, não se permitindo que o Estado ocupe as vagas com candidatos aprovados em novo concurso. O Superior Tribunal de Justiça tem afirmado, em suas decisões mais recentes, que o candidato, nessa condição, tem "direito subjetivo ao provimento do cargo".

Em situação diversa estarão aqueles que foram aprovados fora do número de vagas ofertado em concurso. A eles reconhece-se, apenas, a expectativa de direito de serem nomeados para o cargo concorrido, caso o edital não vede tal ingresso. Isto porque não é incomum depararmos com editais que estipulam que a seleção só é válida para o número de vagas oferecido e que não se formará cadastro reserva. Se de um lado é bom para os que não passaram, possibilitando a preparação para novo concurso, por outro, a medida impõe aos remanescentes, também aprovados, o encargo de uma nova jornada de gastos e estudos, além de impedir que o Estado aproveite os selecionados para as vagas que surjam no prazo de validade do certame. Tal agir contribui para a ineficiência do Estado, que terá que gastar mais em uma nova seleção e deixará, por um bom tempo, de preencher o cargo público vago, em prejuízo da sociedade, que depende do serviço público.

Assim, é importante frisar que, se o edital diz que a seleção só é válida para o número de vagas ofertado e que não se formará cadastro reserva, o administrador não poderá alterar esse número de vagas após o preenchimento dos cargos em disputa, ainda que, em tese, esse concurso ainda estivesse dentro do prazo de validade. Trata-se de respeitar os princípios da vinculação ao edital, da segurança jurídica e da legalidade. Pois, se o edital já cumpriu a sua finalidade, selecionando os candidatos para o número de vagas ofertadas, e tais candidatos já foram nomeados, esse concurso já se exauriu, cumpriu o seu mister. Está vedada, assim, a alteração desse edital para incluir novas vagas, novas exigências etc.

Cabe ao administrador, portanto, muito zelo na elaboração dos editais dos concursos públicos, para não impor a si próprio uma camisa-de-força da qual não poderá sair, revelando a todos a sua incapacidade na gestão do serviço público.

Jornal de Brasília

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