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Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça do MPDFT

Em entrevista acessível em um canal de vídeos na internet, o falecido roqueiro Kurt Cobain discorreu sobre sua infância. Afirmou que foi feliz até os sete anos, quando os pais se separaram. Então seu mundo ruiu. Passou a se sentir “envergonhado” a ponto de não conseguir encarar colegas na escola porque “queria desesperadamente ter a família clássica, típica, mãe e pai”.

Ouçam bem. Tais palavras foram proferidas por um ministro da rebeldia jovem, da libertação de valores vetustos e formalidades mesquinhas. No fundo, tudo não passava de uma armadura. Era só tristeza. Talvez sua cidade, a soturna Aberdeen. Muitos temores nascem do cansaço e da solidão.

Kurt tinha problemas mal resolvidos com o papai e com a mamãe, principalmente com o papai, o que as delícias da fortuna e da celebridade nem de longe sub-rogavam. Conquistar o mundo é bom, mas não como no solilóquio de Macbeth: à guisa de uma sombra errante, de um “poor player” (e põe “poor” nisso) que se exibe e tropeça no palco até sua voz ser silenciada(e põe silenciada nisso).

Na mesma entrevista, ele acrescentou que papai o visitou uma vez, nos bastidores de um show, após dez anos de ausência. O filho deixou claro que “não o odiava mais”, porém aos costumes disse nada. Então eles encerraram, não o vínculo consanguíneo, o que é impossível, mas qualquer chance de amizade que pudesse ser cultivada. Não deve ter sido uma conversa fácil porém, em sua compreensão, foi um alívio para ambos. Se o punhal em suas costas não foi retirado, ao menos não foi enfiado ainda mais fundo.

Kurt se casou, constituiu a própria família, papai, mamãe e filhinha. Mas não era um comercial de margarina. Era um lar mórbido, deprimente, com consumo infrene de drogas pesadas e brigas. Ainda lembrando Macbeth, era um conto de fadas vazio e barulhento, ou melhor, distorcido (e põe distorcido nisso).

Jornal de Brasília - 22/6/2022

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