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Dênio Augusto de Oliveira Moura
Promotor de Justiça do MPDFT

As tragédias que ocorreram no Rio de Janeiro nos últimos meses deveriam servir ao menos para reduzir as possibilidades de que fatos semelhantes se repitam.

No caso da explosão do restaurante Filé Carioca, em outubro do ano passado, chamou a atenção a circunstância de que o estabelecimento funcionava no local desde 2008 com alvará provisório. Agora, suspeita-se de que a causa do desmoronamento de três edifícios no centro da cidade esteja relacionada à existência de uma obra irregular em um desses prédios.

No Brasil, é cada vez mais comum a adoção da chamada "política do fato consumado", em que primeiro se constroem as cidades para depois pensá-las. Essa prática, no entanto, além de comprometer a segurança da população, inviabiliza a ocupação ordenada do solo urbano, violando o zoneamento e incentivando o surgimento de diversos problemas relacionados ao adensamento populacional, ao trânsito, à falta de estacionamentos, à precariedade do serviço de transporte, à poluição sonora e visual, à violência, ao meio ambiente, à má qualidade da água, às condições sanitárias, à produção de resíduos, à saúde e muitos outros.

O Distrito Federal, a despeito de sua origem planejada, não foge a essa regra. Há muito o Ministério Público vem lutando para extirpar do ordenamento jurídico local o denominado "alvará provisório", que por aqui também já foi chamado de "precário", "especial" e "de transição", com o mesmo efeito deletério de favorecer o crescimento desordenado da cidade, dificultar a fiscalização e expor a população a riscos desnecessários.

Várias leis sobre o tema já foram declaradas inconstitucionais a partir de ações propostas pelo MPDFT. No entanto, novas leis são editadas para permitir a continuidade dessa situação, com evidente desrespeito às decisões do Poder Judiciário. Duas delas ainda estão sob apreciação do TJDFT: as Leis Distritais nº 4.457/2009 e 4.611/2011.

É do Sistema Legislativo de Desenvolvimento Urbano e Territorial, integrado pelo Plano Diretor de Ordenamento Territorial, Planos de Desenvolvimento Local e demais normas urbanísticas e ambientais, que se extrai o conteúdo jurídico do princípio da função social da propriedade urbana, o qual está diretamente relacionado ao planejamento e controle da ocupação e uso do solo urbano, voltados para o desenvolvimento sustentável e ecologicamente equilibrado da cidade, a adequada distribuição da população e da atividade econômica, bem assim o fornecimento de infraestrutura compatível, com vistas a garantir, em última análise, segurança e qualidade de vida às pessoas.

Referido sistema normativo estabelece diversas restrições ao funcionamento de atividades em determinados locais, condiciona a expedição de alvarás segundo o grau de incomodidade dessas atividades, e regulamenta, entre outros aspectos, a forma de obtenção de anuência da vizinhança. Além disso, define padrões de qualidade que satisfaçam as condições mínimas de segurança, conforto, higiene, saúde e acessibilidade aos usuários, que devem ser observados na execução das obras e na utilização das edificações.

A emissão do habite-se, por exemplo, que deveria preceder a concessão do alvará, está condicionada ao atendimento de regras técnicas, com o propósito de evitar que problemas estruturais, instalações elétricas inadequadas, instalações de combate a incêndio insuficientes ou inexistentes, ausência de rota de pânico ou de condições de acessibilidade coloquem em risco a integridade dos cidadãos ou produzam ambientes insalubres e perigosos.

Em suma, o alvará de funcionamento, não deve ser entendido como mero formalismo destinado a retirar uma determinada atividade da clandestinidade. É necessário que se dê a esse importante instrumento de controle o conteúdo material que lhe é próprio e que, se devidamente utilizado, pode trazer inúmeros benefícios para toda a coletividade, inclusive segurança jurídica para os próprios empresários.

Conquanto a geração de emprego e renda seja algo premente, é preciso que se o faça de modo responsável, em consonância com a Constituição Federal, a Lei Orgânica e a legislação urbanística, edilícia e ambiental, condição inafastável para a existência de um verdadeiro Estado Democrático de Direito.

Correio Braziliense

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