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Maria José Miranda Pereira
Promotora de Justiça do Distrito Federal


O título acima é propositadamente cômico. Imagine que abaixo dele houvesse um artigo desse conceituado jornal lamentando que a morte atinja sobretudo os ladrões menos abastados, vez que os de sofisticadas quadrilhas, a exemplo dos navalheiros, mensaleiros, sempre conseguem escapar da condenação criminal. Com a liberdade que a Justiça tão agilmente lhes concede, podem usufruir a fortuna surrupiada e destruir provas do crime. Imagine ainda que houvesse estatísticas de quantos ladrões pobres morrem por roubar em “condições inseguras”. E, chegando ao cúmulo, imagine que o articulista propusesse a legalização do furto como solução para promover a isonomia entre ricos e pobres, e para acabar com a injusta morte dos larápios menos favorecidos.

Seria total absurdo. Mas não é menos absurdo do que artigos e reportagens que temos lido nessa feroz campanha para legalização do aborto. Um deles com o título “Mulheres pobres morrem ao abortar”, em vez de propor que as mulheres, ricas ou pobres, deixem de abortar para deixar de morrer (como seria normal propor aos ladrões que deixassem de furtar para evitar risco de morte), propõe que as mulheres tenham o direito de exterminar seus filhos “em condições seguras”. E lamenta que a morte atinja sobretudo as gestantes pobres, uma vez que as ricas podem cometer esse crime em “clínicas particulares”, que oferecem “melhor atendimento”. Em nenhum momento o articulista se refere à vítima do aborto, o bebê, que é sempre morto, não só quando o aborto é praticado em “clínicas clandestinas” e com “métodos caseiros”, mas também quando é feito em sofisticados ambientes dotados de potentes máquinas de aspiração e de afiadas curetas para esquartejamento.

O texto refere-se a dados publicados pela maior rede privada de abortos do mundo, a IPPF, conhecida pelo cognome “A multinacional da morte”, com filiais em 180 países (no Brasil, com o nome de Bemfam). A nefanda organização, segundo o artigo, publicou relatório intitulado “Morte e negação: abortamento inseguro e pobreza”. Além de todas as falácias denunciadas, o documento prima por fraudar dados e manipular informações, como é praxe no meio abortista. Baseando-se em uma bola de cristal, “estima-se” que, no Brasil, sejam realizados 1,4 milhão de abortos e “calcula-se” que 31% das gravidezes terminam em abortamento. Esses dados, baseados na mais científica chutometria, podem ser mudados de acordo com a conveniência do panfletador.

Em 1990, um jornal do Rio de Janeiro dizia que, segundo a ONU, o Brasil era recordista mundial de abortos, com uma taxa anual de 3 milhões. Afinal, são 3 milhões ou 1,4 milhão? Ou seriam 100 mil? Talvez 10 mil? A dra. Zilda Arns, coordenadora da Pastoral da Criança, assustada com a quantidade de abortos que se diziam praticar no Brasil “segundo pesquisas da ONU”, foi consultar a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS, repartição regional da OMS) e recebeu a seguinte resposta em 1993: “Lamentavelmente, não é a primeira vez que, levianamente, se toma o nome da Organização Mundial de Saúde e/ou da Organização Pan-Americana de Saúde para dar informações que não emanam dessas instituições”.

Quanto às mortes maternas, faltou ao documento honestidade para dizer que seu número permanece estável ao longo dos anos em nosso país: 1.577 mortes em 2001, 1.655 em 2002, 1.584 em 2003 e 1.641 em 2004. Desse número, a quantidade de mortes maternas em gravidez que terminou em aborto nunca passou de 200. Seu ponto máximo foi 163 mortes, em 1997. Em 2001, 148 mortes; em 2002, 115 mortes; em 2003, 152; em 2004, 156. Detalhe importante: essa cifra engloba não só a morte materna devida a abortos provocados, mas também gravidez ectópica, mola hidatiforme, outros produtos anormais da concepção, aborto espontâneo, aborto não especificado, outros tipos de aborto e falhas na tentativa de aborto. Com uma gama tão abrangente, a cifra não chega a duas centenas, para tristeza dos abortistas (dados disponíveis na página do Departamento de Informação e Informática do SUS - Datasus).

No entanto, é possível também reduzir a zero esse baixo índice de mortes maternas por aborto. O caminho é exatamente o contrário ao proposto pela “multinacional da morte”: combater a lucrativa indústria do aborto, punir os aborteiros, fazer campanha de valorização da maternidade e da vida intra-uterina, dar assistência material e moral às gestantes em desespero e aos seus filhos nascituros.

É lamentável que governo e IPPF estejam unidos e usando os meios de comunicação social com argumentos falaciosos e falsas estatísticas para impor à população brasileira a aceitação do mais covarde de todos os assassinatos.

Correio Braziliense

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