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Ivaldo Lemos Junior
Procurador de justiça do MPDFT

Policarpo Quaresma, personagem de Lima Barreto, era um patriota obstinado, ingênuo e um tanto quixotesco. Resolveu aprender a tocar violão – instrumento maldito, associado a malandragem – após ter chegado à refletida conclusão de que era o mais genuinamente nacional. Fez uma petição formal para que o vernáculo oficial passasse a ser o tupi-guarani (por isso, sua alcunha na repartição em que trabalhava era “Ubirajara”). E por aí ia.

Ele acaba se mudando da cidade e se lança a uma modesta produção agrícola. Um dia, recebe a visita de um tal Dr. Campos, presidente da Câmara dos Vereadores do município, que lhe pede um “pequeno obséquio” político, aparente ou certamente uma maracutaia. Quaresma se recusa, diz que não se envolve em assuntos dessa natureza, não tem partido e nem mesmo é eleitor. Campos não se perturba, estica o papo com amenidades e vai-se embora.

Dois dias depois, Quaresma recebe uma intimação (assinada pelo próprio Campos), determinando que roçasse as testadas do sítio que confrontassem com as vias públicas. Nem deu tempo para mastigar a mesquinharia da vingança e chega nova intimação, dessa vez para que pagasse 500.000 réis de multa por não ter recolhido impostos.

Veja se você concorda com o desabafo de Quaresma: “aquela rede de leis, de posturas, de códigos e de preceitos, nas mãos desses regulotes, de tais caciques, se transformava em potro, em polé, em instrumento de suplícios para torturar os inimigos, oprimir as populações, crestar-lhes a iniciativa e a independência, abatendo-as e desmoralizando-as”.

E mais: “os governos, com os seus inevitáveis processos de violência e hipocrisias, ficam alheados da simpatia dos que acreditam nele; e demais, esquecidos de sua vital impotência e inutilidade, levam a prometer o que não podem fazer, de forma a criar desesperados, que pedem sempre mudanças e mudanças”.

Jornal de Brasília - 21/2/2024

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