Seu navegador nao suporta javascript, mas isso nao afetara sua navegacao nesta pagina MPDFT - Julie Gianni

Ivaldo Lemos Junior
Promotor de Justiça

Se teu filho te perguntar porque deveria ler ficção, como contos e romances, não seria aconselhável criar um clima de cumplicidade, dizendo que também não leu (enrolou ou colou na escola) ou que leu e não gostou ou isso não fez muita falta. A pergunta é importante e merece uma resposta decente. Na falta de outra melhor, você pode dar o depoimento pessoal abaixo.

No dia 5 de setembro de 1829, em Marselha, Pierre Morrel esperava o representante inglês da firma Thomson & French, que viria lhe cobrar uma duplicata de 287.000 francos. O montante de que dispunha não passava de mixaria perto da dívida, cerca de 15.000. A situação era de desespero irreversível.

O credor era aguardado às 11 horas em ponto e Morrel estava a postos com uma arma já engatilhada. Desonrado, lavaria sua desgraça com o próprio sangue. Já tinha conversado com o filho, Maximillien, que não só apoiara a decisão do pai, como se propusera a acompanhá-lo na aventura suicida, no que fora dissuadido a fim de cuidar da mãe e da irmã.

Eis que, deus ex machina, a irmã recebe a incumbência de buscar uma bolsa em determinada residência da cidade, conforme bilhete do marujo Simbah, o que já havia sido orientado pelo credor inglês. Como é bom termos uma mulher obediente na família! Julie vai e volta a tempo de salvar o pai de sua purgação cruenta, pois na bolsa havia a duplicata quitada (sem que tivesse sido remido um único tostão) e um anel com um diamante do tamanho de uma avelã. Esse anel era o dote para que ela se casasse com Emmanuel, seu namorado e empregado da firma à falência do futuro sogro.

E mais: no porto entra um navio novíssimo, lotado de índigo e cochinilha, os produtos perdidos pela empresa no derradeiro naufrágio de sua embarcação, o Pharaon. Morrel estava salvo.

Pois bem. Diz para teu filho que 5.9.1829 foi um dos dias mais importantes da minha vida.

Jornal de Brasília - 2/9/2020

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